quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Raízes

Os anos da faculdade foram um tempo comum. Os anos passaram. Cada um seguiu um caminho e os mundos ficaram diferentes. Cada um num país, num tipo de emprego, num função social, numa postura política. Até que um dia um, em Amsterda, conversa com outro numa cidadezinha do interior. Eles lembram os sonhos exagerados da época da escola e reconhem, juntos, que em algum momento as coisas mudaram, mas aqueles anos ainda alimentavam a rotina e o brilho nos olhos.

terça-feira, 14 de agosto de 2007

Detalhes

A vida exigiu que ela fosse dura.
Na verdade, nem exigiu tanto assim, mas foi o caminho que ela escolheu. Escolheu e gostou da imagem forte que criou de si mesma. Era forte, firme, poderosa, cheia de idéias preciosas. Valia muito o que ela pensava. Olhava a seu redor e via suas conquistas.
Mas, no fundo, trocaria tudo por um cheiro.

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Tão previsível

Era dia de jogo. Desde que chegou do trabalho ele estava tenso. O jogo era fora de casa e o time certamente teria dificuldade para vencer. Minutos antes da partida, ele estava incomunicável, perdido na tensão. Ela observava. "Nossa, como ele é previsível. Tomara que o time ganhe ou terei que suportar um mega mal-humorado", pensou ela. Jogo difícil, resultado ruim, profecia cumprida.
Na manhã seguinte, antes do café, ela parou diante da balança. Ele observava. "Tomara que apreça o mesmo número que ontem ou ela vai ficar num mal-humor do cão", pensou ele. Peso medido, número ruim, profecia cumprida.

domingo, 5 de agosto de 2007

Antropofagia

A barba grande, as mãos rudes, as roupas sujas, a aparência da exclusão. Ele apareceu na grade do casa e pediu comida para as duas mulheres que estavam no jardim. "A dona da casa não está". "E daí, eu não vou comer a dona da casa. Não sou antropófago".
Antropófago assim, com acento e tudo, saiu da boca do andarilho. Certamente tem muito mais o que dizer, mas foi comido pela cidade.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Insanidade

Encantada com o mundo, a pequena menina soltou a mão da mãe e saiu correndo para o meio da rua. Seria um desespero se não fosse final de semana e a movimentada avenida não estivesse com o trânsito interrompido. Diante da calmaria, nada para se preocupar. Pelo menos seria assim se a mãe não saísse de si. Quando viu a pequena correndo e se afastando de suas mãos, a mãe começou a gritar como se tivesse sido assaltada e a pequena fosse a infratora. Correu atrás da inofensiva infratora, aos berros. Pegou a menina pelo braço, com estupidez, e começou a gritar. Condenou, humilhou e marcou a pequena que, com os olhos arregalados via a mãe enlouquecer. Talvez enlouqueçam as duas.